O indivíduo com doença rara, até chegar ao diagnóstico, passa por pelo menos oito a dez médicos diferentes.
Falta de profissionais capacitados, orçamento insuficiente, poucos centros de referência, tempo muito longo para se obter um diagnóstico. Esses foram alguns dos problemas apontados por especialistas durante seminário realizado pela deputada Celina Leão, na quarta-feira (19), em alusão ao Dia Mundial da Doença Rara, celebrado sempre no último dia de fevereiro.
Segundo o Ministério da Saúde, considera-se doença rara aquela que afete até 65 pessoas a cada cem mil habitantes. Estima-se que existam entre seis e oito mil tipos diferentes de enfermidades raras em todo o mundo. Oito em cada dez delas têm origem genética. As outras envolvem motivações ambientais, infecciosas e imunológicas. Apesar de serem individualmente raras, como grupo essas doenças acabam acometendo um percentual significativo da população. Fibrose cística e esclerose lateral são exemplos disso.
Vice-presidente da Associação Maria Vitória de Doenças Raras, Jessica Guedes é mãe de Rafaela, portadora de Ataxia Epiléptica Pediátrica induzida pelo Estresse. Rafaela é a única criança viva no mundo com a doença.
Durante o seminário, Jessica ressaltou a “batalha” que enfrentou para conseguir um diagnóstico da filha. “Ela nasceu saudável e, com 11 meses, manifestou os primeiros sintomas da doença. Foram quatro anos de investigação, pingando de médico em médico, até que a gente chegou em grandes centros e fez um exame muito caro chamado exoma, que revelou a alteração”, contou.
Profissionais
Segundo a presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica, Têmis Maria Félix, a falta de profissionais capacitados e de centros de referência é um dos principais entraves para um diagnóstico mais rápido.
“O indivíduo com doença rara, até chegar ao diagnóstico, passa por pelo menos oito a dez médicos diferentes”, apontou. “A gente precisa educar os profissionais de saúde para identificar esse tipo de enfermidade.”
Presidente da frente parlamentar, o deputado Diego Garcia (Pode-PR) foi relator no ano passado da subcomissão, vinculada à Comissão de Seguridade Social e Família, que acompanhou o tratamento de doenças raras no País. Um dos pontos observados pelo parecer, lembrou Garcia, foi a ausência de geneticistas. “Mesmo em estados em que há geneticistas, esses profissionais não estão exercendo o ofício porque estão dedicados a outras ações.”
O relatório de mais de 400 páginas aprovado pela Comissão de Seguridade Social sugere ao Ministério da Educação a inclusão da disciplina “genética médica” como obrigatória; a concessão de prioridade a bolsas de iniciação científica para pesquisas no setor; e incentivos para residência médica com foco nessa área.
Orçamento
A falta de recursos também foi apontada no seminário como um dos problemas, já que cada doença pode ter uma demanda e um medicamento diferente, em geral muito caro. De acordo com a diretora da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Vânia Cristina Canuto Santos, o orçamento de 2019 para medicamentos de alto custo foi de R$ 5 bilhões.
Ela sugeriu que os parlamentares direcionem recursos do orçamento federal especificamente para o enfrentamento das enfermidades raras. “A gente fez um levantamento e não verificou nenhuma emenda nesse sentido. Peço aos deputados e senadores que fortaleçam a assistência farmacêutica de alto custo, que também colabora com a descoberta de novas terapias”, disse.
A diretora lembrou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou recentemente norma para o registro de produtos da terapia genética, as chamadas terapias avançadas. Esse método usa células ou genes para tratamento de câncer ou de doenças genéticas raras, o que deve significar um grande avanço para o setor, comentou Vânia Cristina.
Legislação
Celina Leão destacou a importância de se elaborar leis federais sobre o tema. “No Distrito Federal, foi uma lei de minha autoria que ampliou o teste do pezinho, para detectar doenças raras, que podem ter cura”, lembrou a deputada.
Em junho do ano passado, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara aprovou proposta no mesmo sentido, que pretende ampliar os exames obrigatórios realizados em recém-nascidos no País.
Sem listar procedimentos, a matéria aprovada altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, a fim de obrigar hospitais e outros estabelecimentos públicos e particulares a realizar exames “de qualquer natureza” para o diagnóstico de anormalidades congênitas.
Conforme a proposta, que agora está em análise no Senado, a relação dos exames no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) será definida pelo Ministério da Saúde e ampliada progressivamente.
Direitos humanos
Doutora em Bioética e pós-doutora em Direitos Humanos, Aline Albuquerque, salientou que todo paciente com doença grave têm direito a: informação de qualidade e confiável, o que implica no direito de perguntar, e a ter uma segunda opinião; autodeterminação, ou seja, o cuidado centrado no paciente e não na sua doença; vida, com diagnóstico em tempo oportuno e de qualidade; não ser discriminado.
“Não é favor do Estado, não é caridade, é uma obrigação. Nós temos que substituir o modelo do assistencialismo pelo modelo do direito”, defendeu a especialista.
*Fonte: Agência Câmara Notícia
0 Comentários