Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística enviou recomendação ao GDF e à Associação de Artesãos por irregularidades estéticas e de infraestrutura. Segundo promotor, falta de manutenção compromete ponto turístico.

Por Luiza Garonce, G1 DF

Feira da Torre de TV, no centro de Brasília, vista do alto (Foto: Tony Winston/Agência Brasília)

O Ministério Público do Distrito Federal recomendou ao GDF que faça melhorias na infraestrutura da Feira da Torre de TV, no centro de Brasília. O pedido foi encaminhado nesta quarta-feira (9) pela Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), que identificou irregularidades no projeto arquitetônico original.

O governo tem 20 dias para comunicar o MP sobre as medidas que serão adotadas, caso aceite a recomendação. A notificação também foi enviada à Associação de Expositores, Artesãos, Artistas Plásticos e Manipuladores de Alimentos do tradicional ponto turístico do DF.

O G1 questionou o GDF sobre as irregularidades apontadas pelo MP, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Fachada da banca do artesão José Bezerra na Feira da Torre de Brasília (Foto: Luiza Garonce/G1)

Problemas apontados pelo MP

Segundo o Ministério Público, os principais problemas são a descaracterização do projeto, a precariedade e falta de padronização dos toldos – que foram instalados pelos próprios feirantes para proteger as bancas e os clientes do sol e da chuva – e a utilização dos corredores para a exposição de produtos.

“Brasília é uma cidade tombada e a feira fica no centro da capital. Por isso é preciso ter um cuidado maior ainda quanto à concepção do projeto original”, disse ao G1 o promotor que assina a recomendação, Dênio Augusto Moura.

“Quando começaram a adaptar o projeto, cada um colocou um toldo de um modelo e cor. Alguns estão sem manutenção e isso começou a dar aspecto de área abandonada à feira.”

Segundo o promotor, os produtos expostos nas vias de circulação e nos canteiros também são um problema. “A partir do momento em que [os artesãos] se tornam permissionários, precisam observar os parâmetros do Regulamento [Geral da Feira].”

Artesão mostra Regulamento da Feira da Torre de Brasília (Foto: Luiza Garonce/G1)

Regulamento

De acordo com o regulamento, é "expressamente proibido" aos feirantes que trabalham com artesanato, alimentação e trabalhos manuais a exposição de mercadorias fora da área interna da banca – que tem 10m² .

Somente aos vendedores de móveis é permitido usar o espaço externo, desde que respeitem os dois metros entre a banca e a calçada cinza. Apesar da restrição, alguns deles – que não trabalham com mobiliário – recebem anualmente um boleto da Agefis no valor de R$ 30 para uso da área externa.

É o caso do artesão José Bezerra, que trabalha na feira desde 1984 com capim dourado e pedrarias. Ele disse ao G1 que paga a taxa há pelo menos sete anos.

"Só eu e mais uns quatro pagamos." O artesão da banca vizinha não é um deles, mas expõe os produtos na área externa."

O artesão José Bezerra, que trabalha na Feira da Torre de Brasília, mostra cobrança da Agefis por uso da área externa à banca (Foto: Luiza Garonce/G1)

Responsabilidade de quem?

Os toldos que a recomendação do Ministério Público diz estarem despadronizados e sem manutenção foram uma "gambiarra" criada pelos próprios artesãos para proteger as bancas e os clientes do sol e da chuva, já que a extensão do telhado original não era suficiente.

"Antes, ninguém conseguia andar porque não tinha sombra. E quando chovia, entrava água dentro das lojas e ainda alagava", disse o artesão Edmar Braga, que confeciona brinquedos de madeira.

Artesão Edmar Braga trabalha há 21 anos na Feira da Torre de Brasília com brinquedos infantis de madeira (Foto: Luiza Garonce/G1)

Sobre as responsabilidades e competências de cada um dos envolvidos na manutenção e funcionamento da feira, o promotor disse ao G1 que “não fica no jogo de empurra”.

“O regimento já diz o que é responsabilidade de quem. Já ouvi reclamações de que o projeto original não prevê os toldos, não questionamos isso. Queremos o melhor pra cidade. Se o GDF tiver um projeto e for aprovado pelo Iphan, melhor pra cidade.”

A dúvida sobre responsabilidades também recai sobre a manutenção dos quatro banheiros da feira. Segundo os artesãos, o GDF cobra uma taxa mensal de cerca de R$ 50 a cada permissionário pela água trazida por caminhões-pipa.

“Os banheiros são públicos e há mais de ano pagamos água pro cliente ter. Só que quando tem jogo no estádio, os banheiros tem que estar limpos e com água pro governo usar”, disse Braga.

Trabalho manual

Pelo regulamento da feira, o comércio deve abrir as bancas de terça à domingo, e também nos feriados. Na segunda-feira, o funcionamento é opcional. Determinação que, segundo o artesão Edmar Braga – que também é presidente da Federação das Associações dos Artesãos do DF – dificulta o processo produtivo.

Brinquedos de madeira produzidos pelo artesão Edmar Braga, que trabalha na Feira da Torre de Brasília (Foto: Luiza Garonce/G1)

“Nas grandes feiras se compra e revende. Na nossa, nós é que produzimos. A gente não consegue fazer artesanato e manter a qualidade abrindo quase todo dia.”

Braga explica que em alguns dias da semana há poucas bancas abertas.“Numa terça, quarta, quinta, você vê a feira com 15% das barracas abertas. Porque não vem ninguém”, diz ele. O feirante trabalha com o que chama de “resgate de brinquedos populares”.

O artesão reproduz jogos antigos que não são mais fabricados, quase todos em madeira. Ele diz que a feira ainda sobrevive “pelo amor ao artesanato”, que é passado entre gerações.

“Muitos deixam de ser artistas e buscam outras profissões. Do jeito que está indo daqui a pouco eu mesmo vou ter que fechar.”

A artesã Maria Nadi trabalha na Feira da Torre de Brasília há 37 anos com artigos de couro (Foto: Luiza Garonce/G1)

O casal de artesãos Maria Nadi e Carlos José são outro exemplo dessa perseverança. Os dois trabalham na feira há 37 anos, desde quando ela funcionava no pilotis da torre, e era organizada pelos próprios feirantes.

Em 1983, o casal começou a vender acessórios de couro e pedrarias no chão da feira. Conseguiram comprar um tripé e, depois, a estrutura de ferro para montar uma barraca.

Hoje, os artesãos dizem que estão melhor acomodados, mas que contaram com um pouco de sorte. “A estrutura ficou melhor, antes era tudo amontoado. Mas nós ganhamos um ponto bom, perto da praça de alimentação. Tem blocos abandonados, que não vendem nada”, conclui Maria.