Associação de PMs denuncia: “Quem não consegue se aposentar vive no hospital, entra em depressão, comete suicídio”. Foto: Josemar Gonçalves/Cedoc

Jéssica Antunes
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A Segurança Pública do Distrito Federal está doente e correndo para se aposentar. Com a iminência de uma reforma previdenciária que retira direitos conquistados por policiais e bombeiros, a insatisfação corrói os ambientes de trabalho. Os atestados médicos crescem e os pedidos de aposentadoria disparam. Até o fim do ano, mais de mil servidores poderão deixar cadeiras vazias e ampliar o déficit, de cerca de 10 mil. Só a Polícia Civil trabalha com 50% do efetivo necessário.

No ano passado, foram apresentados 1.394 atestados médicos – somente 20 foram de licença maternidade. Na Polícia Civil, houve 3.875 afastamentos por saúde homologadas e 58 licenças maternidade concedidas. A Polícia Militar, por sua vez, diz não divulgar os números se amparando em sigilo médico. O Corpo de Bombeiros também não repassou os dados. “Devido à natureza diversa de cada especialidade, não foi possível precisar um número”, justificou.

Corporações doentes

No ano passado, apenas a Policlínica da PCDF fez mais de 28 mil atendimentos à corporação que tem 5 mil policiais, sendo 4.134 com psicólogos ou psiquiatras. O número é 17,4% maior do que em 2015, quando foram 3.520 casos.

POLICLÍNICA DA PCDF FEZ MAIS DE 28 MIL ATENDIMENTOS, SENDO 4.134 COM PSICÓLOGOS OU PSIQUIATRAS.

“Não temos atenção à saúde física nem mental do profissional”, garante Rodrigo Franco, presidente do Sindicato dos Policiais Civis (Sinpol). De acordo com ele, a Policlínica é “tímida” e não tem capacidade para atender de forma plena a categoria. “Serve muito mais para homologar os atestados, não para prevenir. A profissão é estressante. Todos os dias convivemos com o que há de pior na sociedade, Tudo isso deságua sobre os policiais, que são seres humanos comuns, e às vezes acabam absorvendo toda a carga”, afirma.

Na PM, os casos de adoecimento por questões psicológicas também são constantes. A Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares do DF (Aspra) não tem um balanço concreto, mas a demanda por atendimento psicológico é crescente, afirma o vice-presidente Manoel Sansão. “Toda a classe está doente. Quem não consegue se aposentar vive no hospital, entra em depressão, comete suicídio”, revela.


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Ainda estão previstas 67 aposentadorias até o fim de 2017 no Departamento de Trânsito (Detran), enquanto, no ano passado, foram aprovadas 29 pedidos. Os outros 20 profissionais que podem pedir reforma trabalham na SSP.
No Detran, houve um total de 1.144 atestados, 541 de até três dias de afastamento, 513 com perícia médica e 44 para acompanhamento de familiares. Além disso, foram concedidas 26 licenças maternidade e 20 licenças paternidade.

De acordo com a Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social, 1.101 servidores estão aptos a se aposentar em 2017. O maior número de perdas deve ser na Polícia Civil, onde o déficit de quatro mil profissionais pode se intensificar com 560 que estão aptos a deixar a profissão neste ano. O número é maior que em 2016, quando foram 341.

A Polícia Militar diz que não tem como precisar um número, já que os servidores podem ter 30 anos de serviço e não ir para a reserva por opção. Hoje, a obrigação de reformar é aos 63 anos, se for praça, e 65 anos, se oficial. No entanto, dados da primeira quinzena de janeiro indicam que 304 policiais foram para a reserva. Ao longo do ano passado, foram 1.395.

No Corpo de Bombeiros, o número de militares que deram entrada no pedido de ingresso na reserva remunerada até a primeira quinzena de dezembro é de 150. Destes, 27 foram aprovados e 123 estão em andamento.

Sensação de abandono

“Os militares estão desmotivados. Em todo País a segurança pública foi esquecida e está sucateada. Em Brasília é uma vergonha. Os direitos e as conquistas das categorias estão ameaçados, como licença especial, ajuda de custo, férias. Quem sofre com isso é a sociedade”, afirma o sargento Manoel Sansão, vice-presidente da Associação dos Praças Policiais e bombeiros Militares do DF (Aspra).

A Reforma da Previdência define idade mínima de 65 anos para a aposentadoria e estabelece que só receberá o teto quem contribuir por 49 anos completos. Se aprovado como está, os policiais deixarão de receber salário integral por 85% dos vencimentos, considerando a média dos cargos ocupados ao longo da carreira. Além disso, caso não tirem os três períodos de licença remunerada que têm direito, só receberão um deles. Da mesma forma que somente receberão por duas férias antes da aposentadoria, ainda que acumulem várias.