Moradores se viram como podem. Hoje o racionamento chega à Asa Norte e ao Setor Noroeste

O primeiro dia de torneiras secas nas regiões abastecidas pelo reservatório de Santa Maria – responsável por 24% da água que chega às casas brasilienses – foi de descontentamento. Moradores e comerciantes das cidades afetadas reclamaram bastante do racionamento, alegando que isso só ocorreu devido à falta de gestão eficiente. Para hoje, feriado de Carnaval, o corte será na Asa Norte e no Noroeste.

Essa foi a primeira vez que o racionamento atingiu áreas nobres, como o Lago Norte e condomínios
do Jardim Botânico. O Varjão também sofreu as dificuldades de estar sem água. Ali, Diego Teixeira Ganda, 20, funcionário de uma lanchonete que abre todos os dias da semana, precisou usar um galão com capacidade para 250 l. O volume seria suficiente um dia e meio, já que o local poderia ficar desabastecido durante o religamento, que demora até 48 horas.

Serviço
Hoje, a interrupção é na Asa Norte e Nororeste
Amanhã: Lago Sul (QLs 10 a 28, QIs 17 a 29 e QI 13, Conjuntos 1 a 3), Setor de Mansões Dom Bosco, Setor Habitacional Dom Bosco, Condomínio Privê Morada Sul, Paranoá, Itapoã, Lago Norte (apenas SMILIN, Trecho 13, Lotes de 1 a 13), Taquari, Condomínio RK, Império dos Nobres.
Quinta-feira: Asa Sul, Lago Sul (QLs 2 a 8, QIs 1 a 15, exceto QI 13, Conjuntos de 1 a 3) e Jardins Mangueiral.
Sexta-feira: Sudoeste, Octogonal, Cruzeiro Novo, Setor de Indústrias Gráficas, Setor de Garagens Oficiais, Praça Municipal, Setor de Administração Municipal, Setor de Divulgação Cultural, Esplanada da Torre, Setor de Recreação Pública Norte e condomínios do Jardim Botânico (Jardim Botânico III e IV, Quintas do Sol, Quintas Bela Vista, Quintas Interlagos, Morada de Deus, Quatro Estações, Máxximo Garden, Belvedere Green, Chácaras Itaipú (exceto 80 a 84), Quintas Itaipu, Jardim da Serra e Solar da Serra).
Sábado: Cidade Estrutural, Cruzeiro Velho, Park Sul, SOF Sul, Setor Militar Urbano, SIA, Scia, STRC, SIN, SGCV, SMAS, SPO e Condomínios do Jardim Botânico (Verde, Chácaras Itaipu (de 80 a 84) e Ouro Vermelho I e II).

“Nós oferecemos macarrão, sanduíches, açaí. Sem água, não dá para fazer nada, pois ainda tem que lavar as vasilhas. Tinha que ter feito isso no ano passado, enquanto havia muita água, para prevenir”, reclama o funcionário, que acredita que ainda ficará sem água por boa parte do dia de hoje.

Ontem foi o primeiro dia do ano em que o reservatório do Descoberto, que estava na situação mais drástica devido à seca, atingiu um volume acima da casa dos 40%, exatamente 40,41%. O nível mais baixo do reservatório responsável pelo abastecimento de 1,8 milhão de pessoas foi constatado em dezembro passado, com apenas 19,38%.
O racionamento nas regiões abastecidas por esse sistema começou no dia 16 de janeiro e não tem previsão para terminar.
O nível do reservatório de Santa Maria ontem foi de 46,50%. Apesar de ele nunca ter chegado a um nível tão baixo quanto o do Descoberto, demora mais tempo para sair de um estado de atenção.

A realidade do comércio onde Diego trabalha é comum na cidade: não há caixa d’água. Os comerciantes dizem que nunca pensaram que ficariam sem água por tanto tempo. Para colocar o reservatório interno, seriam necessárias obras, que não podem ser feitas com tanta agilidade. O jeito é recorrer aos galões.

Perto dali, a cabeleireira Luciene Lopes, 35, também sem caixa d’água, não teve como juntar galões. Ela até abriu o salão ontem, mas afirma que, se água não voltar até a manhã de hoje, vai deixá-lo fechado. “O movimento foi baixo. Não foi possível fazer nada. Não tenho como lavar o cabelo da cliente nem o próprio salão. Para tudo precisa de água”, diz.

A situação não é difícil apenas para quem é comerciante. Aos que estão de folga em casa não é possível nem aproveitar o tempo para os afazeres domésticos, como lavar roupa, já que a água reservada tem que ser utilizada para o essencial – para cozinhar e para o banho. “Não tenho caixa. Me preveni enchendo baldes e panelas”, afirma a empregada doméstica Elizângela Conceição, 35, que reclama: “Acho que não deveriam ter feito isso. Prejudica muito a gente. Deixei de lavar roupa e de arrumar a casa no dia que estava de folga”.

São quatro moradores na casa de Elizângela, dois adultos e duas crianças. Como ela mora de aluguel, não quis pagar para instalar um reservatório. Para a mulher, os quatro baldes que encheu não serão suficientes para todo mundo, mas tem que utilizar o que é possível. A doméstica também acredita que vai ficar sem água hoje.

Dias de dificuldades no comércio

Além de Varjão e do Lago Norte, foram atingidos ontem a Granja do Torto, Setor de Armazenagem e Abastecimento Norte (Saan), Setor de Oficinas (SOF) Norte e parte dos condomínios do Jardim Botânico. Hoje, a apreensão se transfere para as outras regiões afetadas.

“Como, numa véspera de Carnaval, eu contrato um pedreiro para fazer uma obra e instalar uma caixa d’água?”, indaga o gerente de uma padaria da Asa Norte Luciano Castanho, 56 anos. A região, junto ao Noroeste, vai ter a água cortada, o que vai atrapalhar o cotidiano do estabelecimento.
Para Luciano, o governo tinha que ter avisado da medida muito antes, já que de uma semana para outra não seria possível instalar um reservatório. Ele lembra que o pão francês, o item mais vendido, não precisa de água apenas na produção da massa, mas também no momento de ser assado, pois o forno tem de receber jatos de água em vários momentos.

O gerente ainda não está certo sobre o que fazer no dia do racionamento, mas garante que abrirá o estabelecimento: “Estou atônito. Mas não posso parar. Temos contas para pagar, de água – com 20% de aumento – e de luz, além de precisar atender a comunidade que está acostumada com o nosso trabalho. É um momento delicado para os empresários, com a crise, e ainda tem que aguentar a falta de planejamento do governo”, desabafa Luciano.

Foto: Myke Sena
Jornal de Brasília